FILA

A Alemanha recentemente conquistou dois torneios com jogadores abaixo dos vinte e cinco anos, relembrando o mundo do futebol de que a fila de futebolistas para vestir a camisa da seleção continua andando. Ou, de forma mais simplista, de que o plano que atingiu o auge no Maracanã não se encerrou naquela tarde de domingo em julho de 2014. E além das campanhas vitoriosas na Copa das Confederações e no Campeonato Europeu Sub-21, deve-se citar também os Jogos Olímpicos de 2016, quando os alemães levaram o Brasil de Rogério Micale, Rodrigo Caio, Renato Augusto, Gabriel Jesus e Neymar aos pênaltis.

Não, esta coluna não pretende “aborrecer” ninguém com pormenores sobre o que aconteceu no futebol da Alemanha a partir da derrota para a Seleção Brasileira na final da Copa do Mundo de 2002. Há ótimos livros escritos sobre o tema, com conteúdo mais do que suficiente para explicar as transformações no processo de geração e educação de jogadores e capacitação de treinadores naquele país. Tão interessante quanto, o resultado desse trabalho é algo que se pode ver, expondo verdades incômodas até para o expert em futebol em rede social, aquela figura afeita a tolices como “eles praticam um futebol chato”.
Em entrevista, há um mês, ao diário argentino Olé, César Luis Menotti resumiu em algumas linhas o caminho que os alemães percorreram durante longos anos: “Antes te atropelavam fisicamente, colocavam sempre um 9 grandão e muito jogo aéreo. Na defesa, faziam perseguições e sair jogando era uma exceção, salvo na época de Beckenbauer, que por sua classe era o único que sabia fazer. Mas nas mãos de Klinsmann e Low, a Alemanha matou o líbero, os stoppers e tudo isso. Começou a juntar jogadores de bom pé, a respeitar uma ideia de ter a bola, e seguiu ganhando, mas de outra forma. Veja, não mudou porque antes não ganhava. Mudou porque esses dois loucos queriam fazer outro futebol”, disse.
Menotti recordou o dia em que foi convidado para almoçar na concentração da seleção alemã, durante a Copa de 2006. Algumas horas antes de enfrentarem a Suécia, Klinsmann – que foi dirigido pelo argentino na Sampdoria – e Low o entrevistaram sobre o que a Alemanha mostrava naquele mundial em casa, e que sugestões ele teria para oferecer. Klinsmann lhe disse que gostaria que “o povo alemão se identifique com esta equipe, que as pessoas se divirtam ao nos ver jogar”. Eram estágios ainda tímidos de uma ideia que teria de lidar com frustrações (semifinais nas Copas de 2006 e 2010 e Euro 2012; final da Euro 2008) antes da alcançar a glória no Rio de Janeiro.
O sucesso da seleção alemã – melhor seria dizer: das seleções alemãs – é o triunfo indiscutível do jogo coletivo em sua máxima expressão, embora não disponha de um megacraque planetário. “Eles têm grandes futebolistas, alguns excelentes como Kroos ou Hummels, mas nenhum craque”, disse Menotti, na conversa com o Olé. A carência, se é que há algum sentido no emprego do termo, é um motivo a mais para aplaudir, não para criticar. Se já fazem o que fazem com posição e circulação, calcule do que seriam capazes se tivessem ao menos um jogador dotado de brilho individual para ser uma ameaça, no um contra um, nas proximidades da grande área.
Com mais uma frase brilhante, Menotti afirmou que a Argentina está distante do nível de futebol apresentado pela Alemanha, e será assim enquanto Messi não atuar em algo que possa ser descrito como um time: “Você pode se meter no mar e ser salvo por um salva-vidas, se estiver se afogando a cem metros da beira. Mas se estiver a dez mil metros, mar adentro, ninguém vai te salvar. E a Argentina hoje está assim, muito longe para que Messi a salve”. Há pouco tempo, podia-se dizer essa mesma frase, substituindo Argentina por Brasil e Messi por Neymar.